Ontem enquanto a caixa do supermercado registrava os produtos que comprei, a senhora que aguardava na fila atrás de mim estabeleceu o seguinte diálogo com ela:
Sra.: - Então, como está?
Caixa: - A vida é ingrata...
Sra.: - Como foi que aconteceu?
Caixa: - Ele foi dormir normalmente e de manhã minha mãe estranhou que ele não estava roncando, chamou por ele e ele não se mexeu, quando chegou mais perto viu que ele não estava respirando... foi uma morte abençoada, meu pai se foi sem sentir nada...
Sra.: - E como você está?
Caixa: - Eu ainda não acordei, sabe? Tô aqui trabalhando meio anestesiada... só faz 8 dias e tô aqui trabalhando... fazer o quê? Tenho meu marido e meus filhos, não posso deixar de trabalhar.
Sra.: - E a sua mãe, como está?
Caixa: - Tá doentinha. Agora tô muito preocupada com ela. Tô aqui trabalhando, mas tô cheia de procupação com ela...
Como ela falava com a senhora e passava os produtos sem olhar pra mim, não viu que eu estava com os olhos cheios de lágrimas, ouvindo a conversa quase sem querer. Paguei e só tive coragem de dizer "obrigada, boa tarde", mas estava me remoendo de vontade de dizer "olha, eu sinto muito, sei o que você está passando, senti essa dor que você está sentindo no ano passado e sei como é..." Mas eu desisti de dizer qualquer coisa porque não iria conseguir dizer só isso, ia dizer que ainda dói e que vai doer por muito tempo, mas que ela ia aprender a viver com essa dor e talvez um dia, até conseguisse se acostumar com ela, de forma que ia achar que a dor teria desaparecido, mas aí eu teria que dizer também que eu acho que ela não desaparece, ela só se acomoda em algum lugar no nosso coração e se disfarça de saudade, e com essa sim, a gente vive para sempre, até expirar o prazo de validade do nosso "sempre" por aqui.
Fui embora sem dizer nada, com lágrimas nos olhos e um aperto no peito, vontade de voltar pra trás e falar tudo o que passou pela minha cabeça, mas escolhi seguir em frente com a minha dor e deixar a moça do caixa quietinha com a dela.
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